quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Entrevista da semana: contrabaixo e preocupação social

“As pessoas estão conseguindo
colocar seus projetos em pratica
porque estão exigindo mais dos
governantes”


O virtuoso baixista, Arthur Maia tocou um mix de música dos seus últimos trabalhos solos, (cinco discos de carreira), no qual encantou o público mostrando muito suingue com frases elegantes. Bastante respeitado no universo da música instrumental brasileira, aportou com seu show, no último final de semana (23), no Pelourinho. O local estava lotado, em sua maioria de baixistas, músicos e fãs que foram conferir à performance do manbass. Com influências voltadas para o funk, jazz e samba, além de ter acompanhado grandes nomes da música popular brasileira como Ivan Lins, Gal Costa, Djavan...expandiu as fronteiras musicais em sua apresentação instrumental.

Com um entrosamento extraordinário com a banda formada por figuras como Gerson Silva, guitarra, Marcelo Galter, piano, André Becker, sax e flauta todos da “terrinha”, única exceção do baterista Cabeça de Côco tocaram temas com intervalo curto entre a passagem de uma música à outra. Os músicos que acompanhavam o baixista estavam bastante à vontade, dessa forma, os espaços eram preenchidos com improvisações e solos jazzísticos, conforme sinalizava Maia, a cada instrumentista.

O baixista regeu os músicos de maneira frenética. Na abertura do show, ele utilizou um contrabaixo modelo fretless, (sem traste) tocando temas como, Miles, B12 e Sonora, assim o público apreciou os detalhes sonoros dessas músicas. Além disso, lançou linhas de baixos com vibratos melodiosos marcados por acordes e, também técnica de slap, (bater e puxar as cordas), modo não muito freqüente de se utilizar, neste tipo de instrumento. Depois, o baixista trocou de equipamento passando a usar um de quatro cordas da marca Tagima, deste modo os presentes puderam assistir a um esbanjamento de musicalidade unido de muito suingue.

Muito falante. Disse que ao encontrar um parceiro musical de longa data, o mesmo falou: “fiz uma música para você”. Ele muito orgulhoso, conforme aparentava ao relatar a história, disparou: “quero ouvi-lá”: então o parceiro disse; “vamos pra sua casa, te mostro agora”. Ele respondeu: “pô cara, já são quase cinco da matina”,....Então, depois de avisar a todos de casa, que havia visita a aquela hora da manhã Arthur abriu uma cerveja e apertou o play do tocador. Neste momento pensou: “esse cara quer-me arrebentar...” “Tamanho, era a rapidez que tinha de conduções e frases de difícil tocabilidade no instrumento, isso num tempo repleto de contratempo”, disse o baixista. O nome da música? Arthur e o gigante, intitulado assim para homenagear o parceiro.

Ao tocar essa música deu-se para perceber a complexidade da canção. Deste modo foi interessante notar a desenvoltura dos músicos que o acompanhava, de não apenas tocar, mas saber que é fundamental fazer base; e eles mantiveram isso com muita precisão.

Participações - No meio da apresentação, Arthur convidou o baixista, Eric Firmino, músico que acompanha cantores e bandas locais, e também o percussionista Orlando Silva, para um groove em mi menor. Neste momento, um baixo fazia a base e outro passeava solando pelo gênero funk. Depois, o espaço foi aberto para Eric improvisar. Neste momento, Firmino utilizou força e balanço, mostrando bastante versatilidade em um instrumento de cinco cordas emitindo frases rápidas e intercaladas de pausas. A técnica usada, por ele, foi a de slap. Já o percussionista manteve a base juntamente com os outros músicos. Entretanto, Silva fazia muitas variações rítmicas demonstrando pontuação precisa em acentos sincopados juntamente com a banda. Neste momento ninguém ficou parado.

No final do show, o público pediu o famoso bis, deste modo o baixista cantou e não fez feio. Maia também tocou em forma de acorde no contrabaixo, um samba, em homenagem ao pai do cantor Nando Reis. Em seguida convidou o músico Joatan Nascimento, nesta hora rolou uma jam memorável com solos viscerais do trompetista deixando algumas pessoas em estado catatônico. Muita gente do meio musical reclama da infra-estrutura e da acústica de algumas casas. Mas o que se viu neste show foi uma qualidade impecável no quesito: som. Bem como pontualidade tanto no inicio do show como no fim da apresentação.

Entrevista: Arthur Maia - “falta, principalmente, estudo de música nas escolas”.

Carioca e sobrinho do lendário baixista Luizão Maia começou ainda criança tocando bateria. Durante a adolescência ganhou um contrabaixo passando a tocar em grupos de diferentes gêneros entre eles: o jazzístico Cama de Gato. Tornou-se profissional, realizou vídeo-aula e apresenta workshop, em várias cidades do Brasil. Além disso, em 1990 gravou seu primeiro disco solo e ganhou o prêmio Sharp, no ano seguinte. Após o encerramento do seu show, ele literalmente pulou do palco para cumprimentar amigos, parentes e fãs, ao final recebeu à reportagem do blog Noite Ponto Som, na lateral do camarim. Demonstrando-se muito feliz em tocar em Salvador de Bahia, mostrou-se bastante preocupado quando suscitou o seguinte assunto: ausência de ensino de música nas escolas públicas do país. Por outro lado, Maia que lembra fisicamente o cantor de samba Zeca Pagodinho, disse que a cena de música instrumental passa por uma boa fase. Confira à entrevista.

Noite Ponto Som - Em sua opinião, em que condição seria possível re-introduzir a música na escola?

Arthur Maia -
Tem pouco ensino de música nas escolas. O Gilberto Gil, que acabou o mandato recentemente, ficou muito insatisfeito com a cota destinada a cultura. O problema da cultura é um problema de governo. A cota ainda é muito reduzida, isso de todas as maneiras. Acredito que a Bahia, talvez seja o lugar que tenha a maior porcentagem investida em cultura. Agora, falta principalmente, estudo nas escolas. Isso pode ser comparado as Olimpíadas, porque, vejo o quanto à coisa é esporádica. Ou seja, temos muito talento e pouca contribuição, também pagamos muitos impostos e temos pouco retorno, isso é mais político do que artístico.

NPS - Na sua avaliação, que ferramenta seria adequada para mudar essa situação?

Arthur Maia –
Acho que cada município deve cobrar de seu governante o que quer, porque pagamos para isso, mas não temos o que desejamos. É necessário, um movimento, porque quanto mais pessoas bradam, mas as coisas acontecem. Acho que a solução é essa. Por exemplo, no lugar em que moro, (Niterói), conseguimos colocar cinco mil alunos de arte no estudo municipal. Isso se deu por causa da pressão que fizemos, porque, se o cara que elegemos não faz nada, no próximo mandato ele já se “queima”.

NPS - Arthur com relação ao festival de música que organiza em Niterói. Como anda as coisas?

Arthur Maia -
Estamos no quinto ano do festival. Já passaram mil e quatrocentos alunos, ocorreram vinte e seis apresentações em quatro anos. Tivemos shows de Hermeto Paschoal, Airto Moreira, Leo Gandelman, Hamilton Holanda, Ricardo Silveira, esses nomes tocaram junto com a galera de Niterói. Eu gostaria que o festival não fosse uma coisa que acabasse no dia em que se encerrasse. Então promovemos durante todo o ano assim contemplamos alunos que ainda estudarão e também àqueles que já estudaram.

NPS - Quem apóia o festival?

Arthur Maia -
É uma mixagem. Uma parte vem da Prefeitura, outra eu na figura de produtor cultural, às vezes, por meio de incentivo do governo Federal. Ou seja, tem várias configurações, mas, principalmente, a que me transforma de músico em produtor cultural. Na última edição tivemos apoio da Vivo e da Prefeitura.

NPS – Atualmente, acredita que há mais lugares para apresentações de música instrumental?

Arthur Maia –
Sim. Está havendo mais espaço, por exemplo, nesta semana fiz cinco shows, ou seja, foram quatro em São Paulo e um em Salvador. Na semana retrasada toquei em Fortaleza, Teresina e Aracajú. Acredito que isso está acontecendo porque as pessoas estão conseguindo colocar mais os seus projetos em pratica, ou seja, exigindo mais dos governantes.

A entrevista foi interrompida porque quando avistou o guitarrista Gerson Silva, sair do camarim, Maia perguntou: “Meu, onde tem um bom lugar pra jantar?”, assim Silva recomendou um restaurante no bairro do Rio Vermelho.............

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